quinta-feira, 13 de setembro de 2007

178 O SEGUNDO CÍRCULO DE PODER

"Uma crista de montanha plana e árida nas escarpas ocidentais da Sierra Madre no centro do México foi o cenário de meu encontro final com Don Juan e Don Genaro e seus dois outros aprendizes, Pablito e Nestor. A solenidade e a importância do que lá ocorreu não deixaram duvidas em minha mente de que nossos aprendizados chegavam ao momento de sua conclusão, e que eu realmente via Don Juan e Don Genaro pela última vez. No final, nós todos nos despedimos e, depois, Pablito e eu saltamos juntos, do topo da montanha para o abismo.Antes daquele salto, Don Juan apresentara um princípio fundamental para tudo o que me aconteceria. Segundo ele, ao saltar para o abismo eu me tornaria percepção pura, movendo-me para adiante e para trás entre os dois reinos inerentes de toda criação, o tonal e o nagual.No meu salto, a minha percepção passou por dezessete batidas elásticas entre o tonal e o nagual. Em meus movimentos em direção ao nagual, percebi que meu corpo se desintegrava. Não conseguia pensar nem sentir no sentido coerente e unificado em que acostumo fazer isso, não sei como, pensava e sentia. Em meus movimentos em direção ao tonal, eu atingia a unidade. Tornava-me inteiro. Minha percepção tinha coerência. Eu tinha visões de ordem. Sua força compulsiva era tão intensa, sua nitidez tão real e sua complexidade tão vasta que não consegui explicá-las satisfatoriamente para mim. Afirmar que fossem visões, sonhos vívidos ou até mesmo alucinações não diz nada que esclareça a sua natureza.Depois de examinar e analisar muito detalhadamente os meus sentimentos, percepções e interpretações daquele salto para o abismo, eu chegara ao ponto em que não podia acreditar racionalmente que aquilo realmente tivesse acontecido. No entanto, outra parte de mim agarrava-se à sensação de que aquilo realmente aconteceu, que eu realmente saltei.Don Juan e Don Genaro não podem mais se encontrados e sua ausência provocou em mim uma necessidade muito premente, a necessidade de avançar no meio de contradições aparentemente insolúveis.Voltei ao México, para ver Pablito e Nestor e pedir seu auxílio para resolver meus conflitos. Mas o que encontrei em minha viagem não pode ser descrito senão como um assalto final à minha razão, um ataque concentrado preparado pelo próprio Don Juan. Seus aprendizes, sob sua orientação - embora ele estivesse ausente - conseguiram, de maneira extremamente metódica e precisa, arrasar em poucos dias os últimos baluartes de minha razão. Naqueles poucos dias, revelaram-me um dos dois aspectos práticos de sua feitiçaria, a arte de sonhar, que é a essência desta obra. A arte de espreitar, outro aspecto prático da mesma feitiçaria e também a pedra angular dos ensinamentos de Don Juan e Don Genaro me foi apresentada em visitas subsequentes e foi, de longe, a faceta mais complexa do fato de estarem eles no mundo como feiticeiros."

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