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domingo, 15 de fevereiro de 2009
972 INTERPRETAÇÃO DOS SONHOS EM FREUD
O fenômeno da distorção dos sonhos: quando nós temos um sonho e não queremos interpretá-lo ou lembrá-lo é porque estamos tentando esconder ou não queremos enfrentar algo que estávamos combatendo, estava recalcado no nosso inconsciente. Nos casos em que a realização de desejo é irreconhecível, em que é disfarçada, deve ter havido alguma inclinação para se erguer uma defesa contra o desejo; e, graças a essa defesa, o desejo é incapaz de se expressar, a não ser de forma distorcida. Podemos, portanto, supor que os sonhos recebem sua forma em cada ser humano mediante a ação de duas forças psíquicas (ou podemos descrevê-las como correntes ou sistemas) e que uma dessas forças constrói o desejo que é expresso pelo sonho, enquanto a outra exerce uma censura sobre esse desejo onírico e, pelo emprego dessa censura, acarreta forçosamente uma distorção na expressão do desejo.
Quando temos em mente que os pensamentos oníricos latentes não são conscientes antes de se proceder a uma análise, ao passo que o conteúdo manifesto do sonho é conscientemente lembrado, parece plausível supor que o privilégio fruído pela segunda instância seja o de permitir que os pensamentos penetrem na consciência. Nada, ao que parece, pode atingir a consciência a partir do primeiro sistema sem passar pela segunda instância; e a segunda instância não permite que passe coisa alguma sem exercer seus direitos e fazer as modificações que julgue adequadas no pensamento que busca acesso à consciência. Convém notar que o afeto vivenciado no sonho pertence a seu conteúdo latente, e não ao conteúdo manifesto, e que o conteúdo afetivo do sonho permaneceu intocado pela distorção que se apoderou de seu conteúdo de representações.
Quando nos referimos aos sonhos num sentido teórico, temos em mente três entidades distintas: o sonho manifesto, os pensamentos oníricos latentes e o funcionamento do sonho. Aquilo que o paciente recorda e relata como o seu sonho, o sonho manifesto, é uma mensagem críptica que exige decifração. Subjacentes ao sonho manifesto estão idéias e sentimentos, alguns dos quais pertencem ao presente, alguns ao passado, alguns dos quais são pré-conscientes, outros inconscientes: é o conteúdo latente. Os pensamentos latentes, dão origem ao sonho manifesto, e estamos interessados no método pelo qual esses pensamentos latentes são transformados nas imagens recordadas como sonho. O conteúdo latente é a parte mais importante do sonho. Os pensamentos e desejos inconscientes que ameaçaram acordar a pessoa são denominados como conteúdo latente do sonho.. Toda a significação, desejos, problemas, neuroses e até predisposições psicóticas estão nesta parte. As operações mentais inconscientes por meio das quais o conteúdo latente do sonho se transforma em sonho manifesto, damos o nome de elaboração do sonho, também chamada dramatização. O processo responsável por essa transformação, que Freud considerava a parte essencial da atividade onírica, é o funcionamento do sonho.
A primeira coisa que se torna clara para quem quer que compare o conteúdo do sonho com os pensamentos oníricos é que ali se efetuou um trabalho de condensação em larga escala. Os sonhos são curtos, insuficientes e lacônicos em comparação com a gama e riqueza dos pensamentos oníricos. Se um sonho for escrito, talvez ocupe meia página. A análise que expõe os pensamentos oníricos subjacentes a ele poderá ocupar seis, oito ou doze vezes mais espaço. O que é claramente a essência dos pensamentos do sonho não precisa, de modo algum, ser representado no sonho. O sonho tem, por assim dizer, uma centração diferente dos pensamentos oníricos — seu conteúdo tem elementos diferentes como ponto central.
O que aparece nos sonhos, poderíamos supor, não é o que é importante nos pensamentos do sonho, mas o que neles ocorre repetidas vezes. No trabalho do sonho, está em ação uma força psíquica que, por um lado, despoja os elementos com alto valor psíquico de sua intensidade, e, por outro, por meio da sobredeterminação, cria, a partir de elementos de baixo valor psíquico, novos valores, que depois penetram no conteúdo do sonho. Assim sendo, ocorrem uma transferência e deslocamento de intensidade psíquicas no processo de formação do sonho, e é como resultado destes que se verifica a diferença entre o texto do conteúdo do sono e o dos pensamentos do sonho. O processo que estamos aqui presumindo é nada menos do que a parcela essencial do trabalho do sonho, merecendo ser descrito como o “deslocamento do sonho”. O deslocamento do sonho e a condensação do sonho são os dois fatores dominantes a cuja atividade podemos, em essência, atribuir a forma assumida pelos sonhos. A conseqüência do deslocamento é que o conteúdo do sonho não mais se assemelha ao núcleo dos pensamentos do sonho, e que este não apresenta mais do que uma distorção do desejo do sonho que existe no inconsciente. Na distorção do sonho, descobrimos sua origem está na censura que é exercida por uma instância psíquica da mente sobre outra. O deslocamento do sonho é um dos principais métodos pelos quais essa distorção é obtida. Podemos presumir, portanto, que o deslocamento do sonho se dá por influência da mesma censura — ou seja, a censura da defesa endopsíquica.
Os sonhos não têm a seu dispor meios de representar as relações lógicas entre os pensamentos do sonho. Em sua maioria, os sonhos desprezam todas essas conjunções, e é só o conteúdo substantivo dos pensamentos do sonho que eles dominam e manipulam. O que é reproduzido pelo aparente pensamento no sonho é o tema dos pensamentos do sonho e não as relações mútuas entre eles, cuja asserção constitui o pensamento. Quando ocorre uma contradição num sonho, ou ela é uma contradição do próprio sonho ou uma contradição oriunda do tema de um dos pensamentos do sonho. Uma contradição num sonho só pode corresponder a uma contradição entre os pensamentos do sonho de maneira extremamente indireta. Alguns sonhos desprezam completamente a seqüência lógica de seu material, outros tentam dar uma indicação tão completa quanto possível dela. Ao fazê-lo, os sonhos se afastam ora mais, ora menos amplamente do texto de que dispõem para manipular.
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